SBDV

Sociedade Brasileira de Dermatologia Veterinária

Primeira sociedade latinoamericana de dermatologia veterinária*


Fundação 16 de março de 2000

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Caso 4

Identificação

Animal Doberman, F, 5 anos, inteira, de nome Kitty, come ação Eukanuba®, tem um contactante saudável, vacinas e vermifugação atualizadas e apresenta uma boa condição corporal, apesar das lesões na pele.

Histórico/anamnese

Queixa do proprietário consiste em múltiplos nódulos e pápulas hiperqueratóticas e hiperpigmentados de variados tamanhos (0,2cm a 2,0cm de diâmetro) disseminados no corpo, acometendo mais a região posterior do pavilhão auricular e a articulação radio-ulna-umeral, mas haviam outros em região cervical e membros posteriores também.

Refere prurido acentuado, animal com reflexo otopedal positivo e alguns nódulos exulcerados com discreto filme melicéico e descamação furfurácea por todo corpo.

Realizado EPRC (Exame Parasitário de Raspado Cutâneo) negativo.

Rec. Ivermectina a ser repetido em 15 dias, banhos com Peróxido de Benzoila (Peroxydex®) e Cefalexina 30mg/kg/BID, com retorno em 30 dias.

Exame físico:








No caso da Kitty, Doberman, os exames complementares pedidos foram:

Bioquímica Sanguínea:

TGO 25UI/L (normal de 10 a 88UI/L)
TGP 42UI/L (normal de 10 a 88UI/L)
Fosfatase Alcalina 88UI/l (normal de 20 a 150UI/l)
Uréia 25mg/dl (normal de 12 a 40mg/dl)
Creatinina 0,8mg/dl (normal de 0,6 a 1,6mg/dl)
Cálcio 9,9mg/dl (normal de 8,6 a 11,2mg/dl)

Laudo Anátomo-patológico:

Avaliação Macroscópica: Dois fragmentos cilíndricos medindo em conjunto 1,2 x 0,6cm, com pele e pêlos ulcerados. Ao corte, consistência fibro-elástica e de coloração branca.

Avaliação Microscópica: Fragmentos de formações cutâneas representado por epiderme com crosta serocelular, exulceração, paraqueratose entremeio a ortoqueratose e colônias bacterianas, hiperplasia epidérmica irregular com alargamento de cones epidêrmicos, hipergranulomatose (grânulos grosseiros) e hipermelanose. Na derme superficial observa-se dilatação vascular e infiltrado inflamatório mononuclear perivascular (linfoplasmocitário e de mastócitos), além de raros polimorfonucleares.

Diagnóstico: Nevo Epidérmico pigmentado.

Com este resultado do histopatológico, vamos tentar entender um pouco mais sobre Nevo, uma alteração comum na Medicina Humana, também conhecida como Mole, mas relativamente rara em Medicina Veterinária.

Na Medicina Humana, Nevo é um termo utilizado para caracterizar uma malformação, normalmente congênita, constituída de excesso ou deficiência de um ou vários constituintes normais da pele, usualmente benignos e pigmentados, podendo ser em relevo ou não; diferente dos Nevo de células névicas, que são tumores benignos de células névicas anormais, derivadas da crista neural. Existem mais de 30 tipos distintos de nevos relatados nos dicionários médicos, sendo sua classificação baseada em sua localização, assim como:

- Intradermal ou Dermal: formações normalmente pigmentadas em marrom, se apresentam em relevo e com pêlos, sendo as células névicas oriundas da derme. Não tem potencial de malignidade.

- Juncional: formações lisas, livres de pêlos com diferentes tonalidades de marrom, sendo que as células névicas se encontram na derme papilar junto à camada basal. Apresentam um baixo potencial maligno.

- Compostos: formações oriundas de displasias do tecido conjuntivo e do tecido elástico, são de nascença ou surgem nos primeiros anos de vida. São geralmente placas nódulo papulososas de bordos irregulares e sua coloração é variável, podendo ser hipocrômicas, amareladas ou acastanhadas.

- Lipomatosos superficial: é uma forma do Nevo Conjuntivo, mas com participação predominante de tecido adiposo. São lesões pápulo-nodulares de coloração normal da pele ou ligeiramente amareladas, localizadas preferencialmente na região glútea.

Há outras formas de classificação pelo tipo de glândulas acometidas, sendo classificados em Nevo Sebáceo , Nevo Écrinos e Nevo Apócrinos, ou, pelo aspecto, como no caso do Nevos Halo, do Nevo Verrucoso e do Nevo Comedônico.

Dentre tantos tipos de Nevo, o grupo de maior importância na Medicina Humana é dos Nevo Melanóciticos, pois apresentam um potencial de malignidade devendo ser removidos cirurgicamente, em especial o Nevo Displásico que possui características próprias com marcadores e precursores do Melanoma maligno. São geralmente múltiplos, com tamanhos variando de 6 a 15mm de diâmetro, bordas irregulares, coloração variável, podendo ser esporádico, mas, são frequentemente familiares, fazendo parte da Síndrome do nevo displásico ou Síndrome B-K.

Outros Nevos com potencial maligno é o Nevo Sebáceo que surge mais comumente no couro cabeludo ou na face. Cerca de 20% se transformam em Carcinomas Basocelular. São geralmente placas de coloração amarelo alaranjada e untuosos ao toque.

Temos ainda um nevo que é o mais famoso e visto por todos, Nevo Flammeus. Conhecido em inglês como Port-wine stain (mancha do vinho do porto), acomete 3 em cada 1000 crianças, são róseos e distribuídos normalmente na face, tendendo a escurecer e se tornar arroxeadas com o avançar da idade da criança. Pertencentes ao grupo dos Angiomas planos, são tumores benignos e congênitos, conhecidos como marcas de nascença, também chamados de Hamartoma na medicina humana.

Em Medicina Veterinária o termo Nevo também se refere a um defeito circunscrito no desenvolvimento da pele, caracterizado como uma hiperplasia de um ou mais componentes da pele, podendo ser congênito ou não. O mecanismo exato de sua formação é incerto. Hoje há discussões sobre a influência do Papilomavirus na sua formação. Pesquisas têm sido feitas com exames de Polimerase Reativa em Cadeia (PCR) no DNA para identificação de frações virais nestas formações, mas a teoria de defeitos na origem embrionária ainda é a mais aceita.

A classificação do Nevo de animais é muito mais simples, tendo uma variedade descrita infinitamente menor.

Nevo Colagenoso:

Solitários ou múltiplos foram relatados em várias raças, acometendo mais frequentemente a região craniana , cervical e próximo a extremidades. São nódulos ou tumores com seu tamanho variando de 0,5 a 5 cm de diâmetro, bem circunscritos e firmes. Geralmente os observamos alopécicos e hiperpigmentados, podendo, às vezes, ulcerar e causar muita dor, principalmente, quando se encontram nas patas.

Na raça Pastor Alemão, é uma síndrome reconhecidamente congênita, com múltiplos nódulos distribuídos ao longo dos membros, região cranial, cervical e tronco ventral. O gene envolvido é autossômico dominante de penetração completa que, segundo WEISS & TEIFKE (1999), afeta somente os descendentes do cruzamento de “Jutta von Colonia Agrippina” e “Fred zu den sieben Faulen”. Este gene se encontra no cromossomo canino 5, sendo um dos poucos tumores hereditários de ocorrência natural em mamíferos humanos.

As lesões surgem nos animais adultos entre 3 e 7 anos de vida. Geralmente as alterações cutâneas estão associadas à cistos renais, cistadenomas e cistadenocarcinomas. Por este motivo os sinais clínicos apresentados pelos cães muitas vezes são inespecíficos como apatia, anorexia, emagrecimento progressivo, polidipsia, vômito, diarréia e outros sinais de uremia, que depende do envolvimento renal.

Há relatos de necropsia destes animais em que se observa Leiomiomas múltiplos no útero, metástases em linfonodos external cranial, paraótico, renais e bronquiais, bem como acometimento do fígado, pulmão, superfícies serosas (pleura e peritônio), baço, pâncreas e até ossos. Surgindo assim, outra teoria de que os nódulos cutâneos seriam uma síndrome paraneoplásica, onde o colágeno é estimulado por fatores de crescimento.

Histopatologicamente se observa áreas nodulares de hiperplasia de colágeno que deslocam órgãos anexos e o subcutâneo.

Nevo Organóide:

É uma manifestação névica mais rara ainda em cães e gatos. São lesões únicas ou múltiplas, de consistência firme, variando em seu diâmetro de 0,3 a 3 cm , às vezes pedunculado, podendo ser na forma linear, cujo relato foi feito em um Old English Sheepdog e um Schnauzer Sandart.

Existe uma forma variante, o Nevo Adnexal, que geralmente é mais inflamado, sendo similar ao Hamartoma foliculosebáceo no ser humano, cujo histopatológico apresenta a lesão circunscrita, por vezes supurativa e com piogranuloma, entre a camada dermal e subcutânea, junto as unidades dos folículos sebáceos com colágeno em abundância. Na forma organóide temos uma hiperplasia de dois ou mais componentes da pele, apenas.

Nevo Vascular:

Encontrado mais comumente na região do escroto, podendo ser visto em outros locais, em cães com idade mais avançada, de raças cuja pele é mais pigmentada, como Labradores, Scottish Terriers, Airedales e Kerry Blue Terries. As lesões são únicas ou múltiplas em placa hiperpigmentada, de crescimento lento e fácil sangramento.

Histologicamente são dilatações cavernosas de vasos sanguíneos, com telangectasia e melanose epidermal, sendo, de certa forma, similares aos Nevo Flammeus nos seres humanos.

Nevo de Glândulas Sebácea:

Usualmente solitário, alopécico, irregular, com superfície papilar e geralmente menor que 2 cm de diâmetro. Pode ocasionalmente se apresentar multinodular, linear, graxentas ao toque e de coloração amarelo-laranjada.

O histopatológico apresenta uma hiperplasia da glândula sebácea associado a uma hiperplasia papilar epidermal.

Nevo Epitriquial da glândula sudorípara:

Uma condição rara, descrita como nodular única na região cervical ou craniana, flutuante, de coloração azulada. Histologicamente temos hiperplasia e dilatação das glândulas sebáceas epitriquiais na derme profunda e no subcutâneo.

Nevo Epidermal:

Este foi o diagnóstico de nosso caso clínico. É um Nevo que se apresenta como lesão solitária ou múltipla, que acomete mais comumente adultos jovens, com predileção para fêmeas, de forma variável, ovalada a circular e até linear em placa. Hiperpigmentadas e de tamanho pequeno, menor que 2 cm de diâmetro. Acomete mais o abdômen, tórax ventral e a face medial dos membros.

Histologicamente teremos hiperqueratose ortoqueratótica, com hiperplasia epidermal papilar, melanose epidermal e papilomatose. Às vezes, acompanha uma degeneração granular da epiderme.

Nevo Folicular

Como sugere seu nome é um Nevo que se origina no folículo piloso, raro, de manifestação única ou múltipla. As lesões são placas ovalóides a lineares, hiperqueratóticas, acometendo mais as extremidades. Eventuais pêlos que se apresentam na lesão são mais espessos em aspecto de escova.

O histopatológico revela folículos e hastes maiores que o normal e agrupadas.

Nevo Comedo

São lesões raras, únicas, bem circunscritas e anulares. Apresentam-se alopécicas, hiperqueratóticas e com comedos. Há quem sugira que a Síndrome dos Comedos dos Schnauzer's seja uma manifestação múltipla do Nevo Comedo.

Observa-se agrupados foliculares hiperqueratóticos e dilatados no histopatológico.

Nevo Corpuscular Pacinian

Muito raro se apresenta no subcutâneo e na região da derme, normalmente sendo múltiplos.

Nevo Melanocítico

É um termo que tem sido muito empregado para lesões adquiridas e muito provavelmente são na realidade Melanocitomas, pois a lesão do Nevo é congênita, mas, extremamente raro.

Tratamento:

Todas as formas têm como tratamento a excisão cirúrgica, exceção é o Nevo Epidermal, que pode ter uma melhora parcial com a administração de ácidos retinóicos, Isotretiona e Etretinato, mas, que para nós Médicos Veterinários brasileiros têm sua prescrição proibida pelo Ministério da Saúde.

Referências Bibliográficas:

• Link Wikpedia

• LANGOHR I. M., IRIGOYEN L. F., SALLES M. W. S., KOMMERS G. D., BARROS C. S. L.: Cistadenocarcinoma Renal e Dermatofibrose Nodular em case Pastor Alemão : 4 casos. Ciência Rural, Santa Maria , V.32, N. 4, p.621-626, 2002.

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• Sampaio S. A.P.; Rivitti E.A.: Dermatologia , 2ª edição (revisada), Artes Medicas, 2001

• SCARAMPELLA F., VON TSCHARMER C., NOLI C.: Linear Organoid Nevus in a Dog. Veterinary Dermatology , V.11, p.69, 2000.

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